domingo, 6 de maio de 2012

Arquivo Rita Lee-matéria de adrianacrisanto | junho 7, 2007


“O rock também tem ovários e úteros”. É assim que tem início o “Cor de Rosa Choque”, primeiro volume de Biogratti uma luxuosa caixa de três DVDs da cantora e compositora Rita Lee, lançado recentemente pelo selo-gravadora Biscoito Fino. O DVD “Cor de Rosa Choque”, a vóvó Ritinha mostra o universo feminino em que foi criada. As gravações, em estúdio e shows, trazem canções antológicas como “Todas as mulheres do mundo,” “Pagú”, “Doce Vampiro”, “Bwana”, “Erva Venenosa” e outras.
Algumas imagens, neste primeiro volume, foram retiradas do show gravado, em novembro de 2006, no Morro da Urca, Rio de Janeiro. Arquivos preciosos contam com a presença de duas poderosas mulheres da música brasileira: Elis Regina e Cássia Eller. Com Eller a roqueira canta Luz Del Fogo (uma gravação antiga da MTV) e “Doce Pimenta”, que segundo a cantora, foi composta para homenagear Elis Regina, que deu uma força a Rita quando a mesma foi presa em 1976 por porte ilegal de maconha.
“Nunca fui uma mulher gostosa, mas sempre expressei muito bem minha sexualidade no palco e na música”, diz a cantora na série depoimentos do primeiro DVD, onde também deixa claro o seu lado feminino cruel e submisso ao mesmo tempo. “Mas, você sempre foi uma mulher gostosa. Só que a estética na nossa época era outra”, rebateu o seu eterno companheiro Roberto de Carvalho responsável pela direção musical.
O rock de Rita Lee sobreviveu a seus próprios instintos autodestrutivos e, por partes de uma perpétua mutação, deixou seus traços em gerações sucessivas. “Rita Lee é mais do que musa. É estátua da liberdade”, diz Caetano Veloso que juntamente com a irmã Virginia Lee e o filho Beto Lee compõe a série de depoimentos do DVD.
Em “Ovelha Negra”, segundo DVD, ela mantém sua fama de mal e em cenas recentes retorna ao Instituto Pasteur, de São Paulo, de onde saiu expulsa no antigo curso científico, porque, segundo ela, tacou fogo no teatro. Rita Lee revela ainda que tinha o hábito de fazer xixi no sapato das amiguinhas no vestiário da escola. Está é passagem do DVD é muito bem sacada. A cantora encontra a porta da escola fechada e retorna como uma equipe de filmagem, disfarçada de Aníbal, um de seus personagens preferidos para sair na rua.
No segundo DVD a ovelha também descreve a família. Sobre o pai, que era cirurgião dentista, ela comenta que o pai era filho de americanos e um sujeito muito feio. “Ele não era bad boy, tinha alcoolismo, um traço que eu também tenho. Mas quando eu nasci ele resolveu parar de beber”, revelou a cantora. A mãe, por sua vez, era filha de italianos, devota de Nossa Senhora Aparecida e muito religiosa. “Minha mãe quase desaba quando viu a filha no festival vestida de noiva e grávida. Infelizmente ela ficou muito doente, meu pai, minhas irmãs e eu vimos aquela princesa se definhando”, conta.
Sobre os ídolos Rita Lee nunca escondeu suas preferências e neste trabalho ela rende homenagens a Carmem Miranda, com seu samba rumbado, Fred Astier e ao seu ídolo máximo James Dean, do qual estampa numa camiseta em um dos shows da caixa, gravado na praia de Copacabana.
O primeiro grupo formado pela cantora foi o “Teenage Singers”, um quarteto feminino composto no colégio. “Cantávamos muito bem e tocávamos muito mal. Um repertório que girava de “Tous les garçons et les filles”, sucesso da francesa Françoise Hardy a “500 miles”, dos americanos Peter, Paul & Mary. Aí apareceram os Beatles e a gente caiu de boca”, escancara.
Depois da Teenage Singers outro grupo se formou. Desta vez o Wooden Faces, que, de acordo com a cantora, cantavam mal e tocavam bem. Da dissolução dos dois saíram “Os Bruxos”, que Ronnie Von levou para seu programa de TV na antiga TV Tupi. O apresentador rebatizou a banda que passou a se chamar “O planeta dos mutantes”. 
A estréia, segundo Rita, foi com a “Marcha Turca” de Mozart. Os irmãos Arnaldo e Sérgio Dias Baptista já faziam parte do grupo quando foi convidado para defender, no Festival de Música da Record, em 1967, a música “Bom dia”, única parceria com Gilberto Gil. No ensaio, diz a cantora, Gil ficou deslumbrado com a guitarra fabricada pelo quarto Mutante e terceiro irmão Baptista, Cláudio Cezar. “Ele era capaz de criar instrumentos que reproduzissem qualquer som de qualquer disco que a gente levasse para ele. Foi ele quem descobriu o theremim, invenção de um russo que ninguém conhecia por aqui. Gil convidou o grupo a acompanha-lo em seu Domingo no parque”, disse.
A guitarra ainda era tabu entre o pessoal da MPB, mas Gil e Rogério Duprat fizeram o arranjo. “Caetano e Gil é que me deram as dicas de como fazer música brasileira. Foram de uma generosidade… de mostrar no papelzinho. Finalmente conheci meu lado brasileiro. Sou mais brasileira que Pelé, ou tanto quanto, mesmo sendo filha de imigrantes. Ou quanto o Geraldo Vandré”, brinca a cantora com a situação.
A música “Balada do louco”, parceria dela com Arnaldo, Rita atualiza a letra, citando Giselle Bundchen e Osama Bin Laden, e reconstitui a célebre cena de como foi expulsa dos Mutantes. “O Arnaldo falou, nós vamos fazer música progressiva. Você não toca nenhum instrumento. Fiquei chocadíssima, mas no meu orgulho disse, ‘tá bom’, recolhi minhas coisas da comunidade da Cantareira e fui embora. Mutantes ficarem imitando Emerson, Lake & Palmer que eu adorava, Yes, que eu adorava, mas imitar…”, critica.
Para quem disse que Rita Lee parecia que iria pendurar as chuteiras em cada edição dos DVD’s a cantora mostra uma música nova em processo de composição. O terceiro DVD é composto por cenas do show ao vivo na praia de Copacabana, onde aparece com uma camiseta estampada “Eu sou o Rio”, cidade que recentemente concedeu a artista o título da cidadã carioca.
João Gilberto também aparece nas imagens do DVD cantando com Rita a canção “Jouxjoux et balangandans” de autoria de Lamartine Babo (repertório de Mário Reis). As imagens são de 1980 e foi cedido pela TV Globo. As revelações são constantes nos DVD’s, a exemplo da canção Mania de Você, composta em cinco minutos após uma longa noite de amor com o marido Roberto de Carvalho.
Nos extras outra participação muito bacana é a do cantor e compositor Tom Zé. “Vai ser muito chato isso. Ninguém vai falar mal dela”, diz o cantor que ao mesmo tempo que esculhamba com a filmagem, homenageia a cantora e revela que a parceria que fizeram em 2001 (dos versos proféticos, “computador me resolve”), de 1968. Inicialmente o próprio Tom Zé fez música e letra, mas não gostou do resultado final nem do nome inicial, “Astronauta libertado”. “A Rita fez uma música caipira como Kubrick utilizou no filme 2001 uma valsa, que é a música caipira deles”, comentou. 
Ao final Rita Lee revela que está cansada das turnês e que passa a maior parte do tempo em casa, tocando, compondo ou brincando com a netinha Isabella, filha de Beto Lee, mostrada em várias performances com a vovó Ritinha nos corredores do Copacabana Palace, no Rio de Janeiro.
Adriana Crisanto
Repórter

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